Existe no jornalismo
uma expressão incrível e que eu adoro para designar uma vertente de produção
textual. É o chamado “jornalismo punheteiro”. É sério, essa expressão existe de
verdade. Procurei e não encontrei uma definição “séria” de algum grande teórico
da área, então lá vai uma explicação bem educativa.
Sabe na época da Copa
do Mundo, quando você abre seu site de notícias preferido para verificar os
gols da sua seleção, e se depara com uma matéria do tipo “Musas que embelezaram
os estádios nessa rodada”? Ou durante as Olimpíadas, quando uma atleta de
levantamento de peso chocou a sociedade (!) porque, absurdo dos absurdos, tinha
pelos nas axilas? Isso é o jornalismo punheteiro.
![]() |
Jornalismo punheteiro na sua mais pura forma. |
Essa produção textual
de 15 anos de idade objetifica as mulheres em qualquer área e faz com que elas sejam destaque, pro bem ou pro mal,
por suas características físicas. E só. São aqueles escândalos escabrosos do
tipo “atriz Fulana vai à praia com o filho e paga peitinho”.
Para os jornalistas
adeptos dessa vertente – normalmente homens, membros de editorias de esporte ou
revistas masculinas – mulher bonita é pra ser admirada. Não importa se ela
ganhou o Prêmio Nobel de Química, descobriu a cura do câncer ou é a brasileira
mais jovem a escalar o Everest. O importante é ser bonita.
Não existe muito o que
dizer sobre esse jornalismo que se tranca no banheiro, ele deveria ser absurdo
por si só. Então o objetivo dessa curta postagem é mais um convite a repensar
essas asneiras que a gente considera tão normais. Será mesmo esse o único viés
existente para matérias envolvendo mulheres? E será que o pauteiro, editor ou
repórter realmente pensou que esse gancho seria super inusitado? E não, gente,
não é perseguição, ou paranoia de jornalista feminista. Desafio vocês a me
dizerem que é normal a decisão de capa da GQ ao anunciar os homens e mulheres
do ano, de acordo com a redação deles.
Sério? Quer dizer,
porque a gente não põe todo mundo pelado de uma vez?
O que a gente não pode
esquecer nunca (nem o público, nem os jornalistas), é que o jornalismo é um
formador de opinião poderoso. Eu sei que em cinco textos vocês já me viram
falar isso umas quatrocentas vezes, mas ao objetificar as mulheres dessa
maneira tão escancarada a mensagem que passamos é “ok, você pode até ser boa na
sua área, mas se não for bonita, feminina e recatada, nada mais importa”. Será mesmo
essa a mensagem que a gente quer passar? E, se for, temos ideia de como isso
prejudica metade da população?
Um bom exemplo é a
política. Esse texto excelente da Karla T fala mais profundamente sobre o
assunto, mas eu estou aqui só pra agitar o caldo. Vocês já repararam como
sempre que alguém quer condenar a postura política da Dilma, por exemplo, acusa-a
de ser “feia” ou “sapatão”? Eu vi cartazes nos protestos de junho, dessa nossa
juventude revolucionária, que diziam exatamente isso. Interessante é que eu
nunca vi o Lula ou o Fernando Henrique serem chamados de “feios”, “barbudos”, “viadinhos”
ou qualquer outra idiotice durante seus mandatos. Eles eram “bêbados”, talvez,
ou “engomadinhos”, mas sua sexualidade ou expressão de gênero nunca foi
questionada. E nem deveria. Isso é uma tremenda babaquice.
![]() |
Acho mágico como o jornalismo punheteiro consegue se infiltrar em absolutamente qualquer matéria. |
Por isso, pra resumir,
não, não é legal destacar uma mulher em sua área porque ela é ou não é bonita. Se
‘tá difícil pensar em pauta, porque a gente não fala de como o futebol feminino
no Brasil é marginalizado, mesmo a gente tendo a melhor jogadora do mundo? Ou
de como pouquíssimas empresas tem CEOs mulheres? Ou como policiais sofrem com o
machismo nas corporações, ao invés de mostrar como elas se mantém “femininas”
em uma profissão tão “masculina”? Seriam textos interessantes de se ver.
Vamos deixar a o
jornalismo punheteiro só pra Playboy, que tal?
- Existe um tumblr maravilhoso que se dedica a mostrar essas e outras pérolas do jornalismo punheteiro no nosso Brasil. É o Jornalismo Punheteiro e vale boas risadas (ou choros).
0 comentários:
Postar um comentário
Click to see the code!
To insert emoticon you must added at least one space before the code.